Liderança no feminino: “Estamos num momento de grande transformação” 1724

A Licenciatura em Ciências da Nutrição da Nova Medical School promoveu, no passado dia 05 de janeiro, uma aula aberta de Políticas de Saúde, subordinada ao tema “Liderança do Feminino”. Durante mais de duas horas, um painel de personalidades de relevo na Saúde em Portugal analisou a Mulher no espaço público.

Não só os papéis de liderança se assumem “cada vez mais no feminino”, como tendencialmente perfazem uma realidade que se exige efetivar mais cedo, assim que “os mais experientes lhes derem espaço para isso”, referiu Francisco Goiana da Silva. O membro da Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde foi o único homem a discursar, e o primeiro a falar, para passar o testemunho a Alexandra Bento, coordenadora do Departamento de Alimentação e Nutrição do INSA, que a seu lado coordenou a aula e adotou o papel de moderadora.

“Temos um conjunto de grandes mulheres na Saúde em Portugal”, explicou, para lembrar Carolina Beatriz Ângelo, republicana e sufragista. A primeira mulher a votar no país, nas eleições para a Assembleia Nacional Constituinte de 1911, era elegível ao voto, uma vez que não só era chefe de família, como detinha formação superior. A Lei partia do princípio de que uma mulher não reuniria os requisitos, por isso Carolina conseguiu votar.

Quebrar estereótipos 

“Esta agenda foi colocada na ordem do dia há 75 anos, quando se aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos“, atestou Maria de Belém, referindo-se ao passo importante para a emancipação feminina através de um documento que estipulava que “todos os seres humanos são iguais em direitos e dignidade”. Apesar de a Declaração poder parecer “muito simples e evidente, ainda não o é”, pois a realidade nos demonstra uma “vida pública para os homens e uma vida privada para as mulheres”, relegadas para uma inferioridade de género.

“Ainda hoje temos mulheres a viver mais anos, mas com muito mais problemas de Saúde, porque as mulheres conquistaram um lugar na vida pública, mas não foram libertadas das suas tarefas”, o que significa que “têm um duplo fardo e continuam a ter remunerações baixas”. Aponta como favor positivo o facto de cerca de 50% de investigadores no país serem mulheres, mas admite que os dados revelam a necessidade de várias décadas para se atingir a paridade desejada em termos salariais. A máxima “trabalho igual, salário igual” não é uma realidade.

A implementação de quotas de género na política, por exemplo, “é muito desagradável, porque há uma imposição quando devia ser natural”, refere a histórica socialista. No entanto, diz, é uma medida necessária, pois “permite que valores e talentos escondidos apareçam”. “A percentagem de mulheres como Chefes de Estado é irrisória”, acrescentou a antiga deputada e Ministra da Saúde (1995-1999) e da Igualdade (1999-2000). “Estamos num momento de grande transformação” que deve continuar a ser estimulado, em prol da emancipação feminina.

Coragem e dinamismo

Para além de ser mulher, Rita Sá Machado tem uma característica “diferente dos anteriores diretores-gerais da Saúde, que é estar na faixa dos 30-40 anos”. A sucessora de Graça Freitas é a apenas a terceira mulher a chefiar a Direção-Geral da Saúde (DGS), numa lista com 22 nomes. Nomeada pelo Ministério da Saúde, após se ter colocado à prova no concurso público do posto de chefia, não encontra uma tendência no feminino.

“Dentro da cúpula da administração da Saúde, sou a única mulher na liderança de topo”, explicou, para apontar um longo caminho a percorrer. “Não somos melhores nem piores, somos diferentes”, destacou, para apontar uma “componente emocional forte e relacional”. A mulheres, acredita, “têm coragem, dinamismo” e noção dos limites: “no dia em que for a melhor DGS, serei pior mãe ou filha”.

As mulheres “não são instigadas a chefiar” e, por isso, teorizou, se fosse homem teria “a vida mais facilitada”.

Visão de liderança

“Nós, enquanto educadores, temos que começar a chamar a atenção para os comportamentos, as expectativas das pessoas, a empatia e a inteligência emocional”, acrescentou, por sua vez, Helena Canhão. A diretora da Nova Medical School lembrou estudos que demonstram que as mulheres são desvalorizadas com, por exemplo, um estudo em que são avaliados dois currículos iguais, com géneros diferentes, com valorização do Homem.

Finalmente, coube a Ana Paula Martins, presidente do Conselho de Administração do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Norte, apresentar a sua visão. “Cada um de nós é único e irrepetível”, garantiu, e apontou a motivação e a aceitação de mudanças a enfrentar perante decisões difíceis como aspetos a considerar num ou numa líder. “Parece-me que os homens e as mulheres se complementam, nós somos mais resolvidas”, acredita.

O que as torna mais “aptas e seguras” é o facto de “assumirem com humildade” os erros e aprenderem como os podem aproveitar para, no futuro, fazer melhor. Contudo, “muitas vezes as mulheres não chegam a lugares de liderança porque outras mulheres não promovem”, concluiu.

No fim, a mensagem ficou-se, por entre as oradoras, pela necessidade de dar mais voz e espaço a quem tem capacidade, ao mesmo tempo que se incentivam as Mulheres a abraçar a vida pública e os cargos de liderança.