Nutrição Primavera-Verão 2017 663

Azeite é tão démodé… Pão, daquele de trigo e cheio glúten? Já era… Queijo fresco não, agora só skyr! Parece brincadeira, mas não. Hoje em dia, há planos alimentares que parecem saídos das páginas de uma revista de moda, tal não é a série de “do’s and don’ts”!

Do mesmo modo que se ditam tendências na moda, a cada primavera-verão surgem novos conselhos alimentares. Depois de vilipendiados durante algumas temporadas, voltam em grande os ovos ao pequeno-almoço. A granola está a ficar em desuso, mas panquecas com farinha de alfarroba ou quinoa, estão in. Açúcar, esqueça, está completamente out – tem de usar mel ou xarope de agave. E que dizer do regresso dos “tudo ou nada”? Voltam os alimentos que se pode comer à vontade, porque “não engordam” e aqueles em que “nunca” pode tocar. Uma vez que a ciência por detrás destas modas é muito reduzida (para não dizer nula…), atrevo-me a dizer que alguém se deve divertir imenso a pegar em textos de moda e substituir a terminologia têxtil por nomes de alimentos. Onde se lê “padrões às riscas” usar “trigo”. Substituir “pretos e cinzas” por “bulgur”. E por aí em diante… O resultado é “hipster”, super fresco e soa bastante moderno. Apelativo, não?

Parece estranho que, depois de anos em que os nutricionistas se afirmaram na sociedade precisamente por desmistificar ideias redutoras sobre nutrição e alimentação, estejamos a voltar ao discurso simplista dos “bons” e “maus”, agora embelezado com apontamentos “trendy”. Parecem esquecidas algumas frases conhecidas do saudoso Dr. Emílio Peres, como “Abençoado pão”, “Leve uma vaca para casa” (em referência à importância do leite) ou “O Homem alimenta-se de comida e imaginário”. Esta visão abrangente da alimentação, num país de raízes tradicionalmente mediterrânicas, pode explicar porque temos uma Roda dos Alimentos, em vez de uma Pirâmide (onde os alimentos podem parecer hierarquizados). Na Roda todos os alimentos são importantes, mas uns são para comer mais vezes ou em maior quantidade, outros são para comer raramente ou em pouca quantidade. Aliás, recentemente, a Roda ganhou uma versão mediterrânica, justamente como forma de reforçar o nosso padrão e tradições alimentares.

Como explicar então este “retrocesso”? Talvez seja porque hoje temos menos tempo para explicações longas, e enquadrar o uso dos alimentos no contexto de cada pessoa dá trabalho e não permite soluções padronizadas. Talvez seja porque hoje tudo tem que caber nos 140 carateres do Twitter, num título do Facebook ou resultar bonito no Instagram. Ou, simplesmente, talvez as pessoas gostem de novidades e por isso, tal como a moda, a alimentação é feita de ciclos e opções que vão e vêm… Resta-nos esperar que a evidência científica seja a moda para ficar nas próximas estações e que a Nutrição seja tratada como uma Ciência e não apenas como algo que tem de ser “fashionable” para interessar às pessoas.

Nota final: claro que é sempre mais fácil dizer “coma isto” ou “não coma aquilo”. Mas para quem quer ir além dos lugares comuns e aprofundar os seus conhecimentos, decorre esta semana o XVI Congresso de Alimentação e Nutrição. Para além das mais recentes evidências científicas, vai poder também ouvir falar das “últimas modas”. E claro, a Viver Saudável vai lá estar!

Rodrigo Abreu,
Nutricionista

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