O tempo de sono: Um fator de risco metabólico esquecido 1347

Por Inês Timóteo, Nutricionista (5991N), Investigadora Júnior Comprehensive Health Research Centre (CHRC) e alumni da Licenciatura em Ciências da Nutrição da NMS | FCM.

 

A infância constitui uma fase crítica do desenvolvimento, essencial para a expressão adequada do potencial genético (genótipo) de cada indivíduo. É neste período que se formam preferências e hábitos alimentares e de estilo de vida — como a prática de atividade física e os padrões de sono — que tendem a perdurar até à idade adulta.

O sono é um dos pilares fundamentais do estilo de vida saudável, frequentemente negligenciado, mas com impacto decisivo no crescimento, desenvolvimento, função cognitiva, aprendizagem e atenção da criança. A American Academy of Sleep Medicine recomenda entre 9 a 12 horas diárias de sono para crianças entre os 6 e os 12 anos, e entre 8 a 10 horas para adolescentes dos 13 aos 18 anos. A evidência científica associa o não cumprimento destas recomendações a um maior risco de doenças crónicas, como obesidade, diabetes tipo 2 e hipertensão.

A duração insuficiente do sono tem sido também associada a alterações nos padrões alimentares, nomeadamente ao aumento do consumo de alimentos com elevada densidade energética e baixo valor nutricional, como fast-food, snacks doces ou salgados, e bebidas adoçadas ou açucaradas. Estes comportamentos contribuem para um estado nutricional inadequado e maior risco de desenvolvimento de doenças crónicas na infância e vida adulta.

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Além disso, a curta duração do sono tem sido relacionada a uma menor prática de atividade física. A Organização Mundial da Saúde recomenda, pelo menos, uma hora diária de atividade física moderada a vigorosa em idade escolar. Estudos sugerem que a privação de sono e o excesso de peso contribuem para a resistência à prática de atividade física e brincadeiras ativas, o que, por sua vez, reforça o ciclo de sedentarismo. Em paralelo, observa-se um aumento do tempo de ecrã, quer em contexto de televisão, videojogos ou dispositivos móveis. A literatura aponta o impacto negativo do tempo excessivo de ecrã nos padrões de sono e estado nutricional na infância, apesar da ausência de consenso sobre um limite seguro de exposição. Medidas como a proibição da utilização de telemóveis nas escolas do 1.º e 2.º ciclos podem revelar-se eficazes na promoção da saúde infantil, fomentando maior interação social, melhor qualidade do sono e, consequentemente, um impacto positivo global na saúde.

Em Portugal, o estudo transversal RUN-UP pretendeu caracterizar os estilos de vida das crianças do 1.º ciclo do concelho de Évora, avaliando indicadores como o estado nutricional, preferências alimentares, atividade física, comportamentos sedentários e padrões de sono. Esta abordagem holística permitiu identificar fatores de risco e permitirá fundamentar estratégias objetivas de prevenção. A análise regional poderá ainda servir de base para futuros estudos de maior abrangência geográfica e para a definição de políticas ajustadas às necessidades reais da população infantil.

Os resultados preliminares, já apresentados no XXV Congresso de Nutrição e Alimentação, indicam que 22% das crianças avaliadas não cumpriam as recomendações de tempo de sono. Verificou-se ainda uma associação entre o menor tempo de sono, maior tempo de ecrã e um padrão alimentar inadequado (incluindo consumo excessivo de snacks e bebidas açucaradas) e piores indicadores de saúde, nomeadamente risco metabólico aumentado.

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A promoção de um estilo de vida saudável na infância exige uma abordagem integrada que considere o sono como um dos seus pilares essenciais. Na prática clínica, a avaliação dos padrões de sono deve ser considerada, a par dos hábitos alimentares e de atividade física. A duração do sono, as rotinas de deitar e acordar, bem como o tempo de exposição a ecrãs, devem ser avaliados e discutidos com a criança e os seus cuidadores, como parte de uma estratégia educativa e preventiva, com potencial de impacto significativo na saúde a curto e longo prazo.

 

Referências: PMID: 36312682; ISBN: 9780199940318; PMID: 31121414; PMID: 27250809; PMID: 36102411; DOI: 10.4103/ATMR.ATMR_181_24; PMID: 32328254; PMID: 30353810; PMID: 34620305; PMID: 36674025; ISBN: 9789240015128; PMCID: PMC11280700;