Uso racional de sangue nos cuidados paliativos: um equilíbrio difícil de encontrar 683

Há cerca de 80 mil portugueses afetados pelos cuidados paliativos, onde se impõe uma melhor gestão do uso do sangue, um dos recursos “mais escassos”

Encontro junta especialistas num debate sobre as melhores formas de gestão nestes cuidados

Numa altura em que tanto se tem falado sobre a escassez de sangue, resultado do distanciamento imposto pela pandemia que afastou muitos portugueses das dádivas, um grupo de especialistas reúne-se, em formato digital, para debater o ‘Uso Racional de Sangue nos Cuidados Paliativos’, uma área que adquire cada vez mais importância. “O sangue é um recurso escasso, não há engenharia genética que o consiga produzir”, reforça Rui Tato Marinho, Professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, Diretor do Centro de Medicina Paliativa da mesma Faculdade e diretor do Serviço de Gastrenterologia e Hepatologia do Centro Hospitalar Lisboa Norte, gastrenterologista e hepatologista, que organiza o evento e será um dos oradores. “Houve um impacto muito grande da pandemia nas dádivas de sangue, que tornou ainda mais escasso este recurso, que além de tudo é muito caro. Se o sangue e os seus derivados fossem considerados medicamentos, eram dos mais caros e aqueles em que o País mais milhões gasta.”

É amanhã, a partir das 18.30h, que se irá falar sobre o uso racional de sangue numa área que ganha cada vez mais relevância, os cuidados paliativos, e que impacta milhares de portugueses. De acordo com o especialista, estima-se “que temos à volta de 90 mil portugueses a precisar de cuidados paliativos, dos quais 80 mil adultos e cerca de 8 mil crianças. São pessoas em situação muito difícil, e não são só estas pessoas que estão em sofrimento, mas também as suas famílias. Eu diria que talvez meio milhão de portugueses são direta ou indiretamente afetados pelos cuidados paliativos, o que torna este um tema extrema relevância social”.

E uma das complicações mais frequente nas pessoas em fim de vida é a anemia. “É muito fácil encontrar, nos cuidados paliativos, pessoas com anemia, que tendencialmente poderiam ser transfundidas. O que queremos é alertar para a melhor gestão do sangue em situações em que já não há praticamente nada a fazer, a não ser dar conforto. É não usar o sangue em vidas que não vão ser salvas e, por outro lado, direcioná-lo para salvar a vida de quem mais precisa.”

Paulo Pina, especialista em Medicina Paliativa e professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa, outro dos oradores do evento, realça que, “na medicina paliativa, dado que a maioria dos doentes tem uma condição de terminalidade, ou seja, ainda que nem todos sejam doentes terminais, são doentes com doenças incuráveis, é preciso ser mais prudente no pedido de sangue”.

“Nós não dizemos que somos contra ou a favor do sangue, somos a favor da proporcionalidade, ou seja, somos a favor de tudo, se a situação do doente assim o permitir”, refere o especialista, reforçando que “o médico tem de ser mais criterioso e não usar de forma obstinada nem os exames complementares de diagnóstico, nem os tratamentos”. Quanto ao uso racional de sangue, classifica-o como “vital, porque estamos a falar de um recurso caro e nem sempre muito abundante, que está dependente de doações”.

O especialista defende também a necessidade de mais “literacia, para os leigos e para os profissionais de saúde. O modelo triunfalista da medicina tem de ser abandonado. Nós não conseguimos tratar todos nem curar todos, temos é de cuidar de todos os que nos procuram, sem abandonar doentes. Mas não podemos prometer que os vamos curar a todos. E os tratamentos têm de ser proporcionais às patologias”.

A Rui Tato Marinho vão juntar-se ainda, neste debate, Álvaro Beleza, diretor do Serviço de Sangue do Hospital de Santa Maria, a quem caberá falar sobre o uso racional de sangue e as melhores estratégias para o seu aproveitamento.

A moderação estará a cargo da jornalista de Saúde, Marina Caldas.

Aberto a todos os profissionais de saúde, o evento reforça ainda existência de estratégias para gerir melhor este escasso e caro recurso: “Na anemia, o ferro injetável é uma dessas alternativas; promover as dádivas de sangue como um dever humanitário e de cidadania; reaproveitamento do sangue gasto durante uma cirurgia, etc. refere ainda Rui Tato Marinho.

Mais informações em: https://www.medicina.ulisboa.pt/conversa-com

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