Por Sofia Almeida Costa, PhD em Saúde Pública e Investigadora SOSFood; Nova Medical School, Universidade Nova de Lisboa.
Atualmente é inquestionável o impacto de uma dieta na saúde humana, animal e ambiental. Sabemos que a preferência e o consumo de alimentos nutricionalmente desequilibrados, juntamente com práticas de produção não sustentáveis, tornam urgente a necessidade de reformular toda a cadeia alimentar.
As alterações dos padrões alimentares, a inovação tecnológica nas práticas agrícolas e a redução do desperdício/perda alimentar são ferramentas essenciais para que sejam alcançados objetivos ambientais sustentáveis, beneficiando-se assim a saúde de toda a população.
Porém, as questões relacionadas com a sustentabilidade alimentar não podem ser vistas como responsabilidade de um único setor. Do agricultor ao consumidor final, passando pela indústria, retalho e ação governamental, todos os envolvidos são chamados a unir esforços para garantir um futuro em que produzir e consumir não se traduza no esgotamento dos recursos da nossa Casa Comum.
Deste modo, a sustentabilidade alimentar deverá ser encarada não só como um desafio global, mas também como uma verdadeira oportunidade de transformação coletiva.
Também o recurso a instrumentos de inteligência artificial (IA) deverá ser tido em consideração quando pensamos numa green transition verdadeiramente holística e realista. Todos os dias, milhões de dados são gerados nos mais variados pontos da cadeia alimentar, tornando esta informação dispersa e subaproveitada. Desde sensores climatéricos, dados de explorações agrícolas, flutuações dos preços de mercado, até aos relatórios de consumo e desperdício alimentar, tudo isto são fontes válidas e de extremo valor, que poderiam servir em muito o interesse coletivo. Com a ajuda da IA, de tecnologias inovadoras e de ferramentas preditivas, será possível otimizar a produção, antecipar padrões de procura, reduzir perdas e, assim, apoiar decisões mais estratégicas tanto para produtores como para distribuidores e decisores políticos.
O SOSFood (Sustainability Optimization for Secure Food Systems) é um projeto financiado pela Comissão Europeia (101134894) com três objetivos principais. O primeiro, criar uma rede para a recolha de dados a partir de diversos sistemas, nomeadamente social, político, legal, económico, tecnológico, alimentar, saúde e ambiente, promovendo a transparência e a partilha de dados ao longo da cadeia alimentar. O segundo, mapear o cenário do sistema alimentar com uma estratégia multidimensional, explorando a interoperabilidade dos dados com análise de impacto avançadas e tecnologias inovadoras de IA. Por fim, (co)desenhar soluções, no formato de ferramentas de decisão, adaptadas a cada nível do sistema alimentar e personalizadas de acordo com o contexto e prioridade de cada utilizador.
Na prática, o SOSFood resultará num espaço de dados alimentares consolidados, com o objetivo de melhorar e promover a sustentabilidade alimentar. Ao criar novas ferramentas como um painel de indicadores preditivos (predictive dashboard) direcionado a produtores e à indústria alimentar e uma aplicação para telemóvel (mobile app) destinada a consumidores, auxiliará a tomada de decisão nos diferentes níveis do sistema alimentar, facilitando escolhas alimentares mais justas, saudáveis e sustentáveis.
Olhando para o panorama atual de emergência ambiental, apenas a partir de decisões bem informadas podemos desenvolver intervenções que transformam a cadeia alimentar de valor num sistema mais produtivo, inclusivo, sustentável e resiliente.
Nos últimos anos, apesar de terem surgido muitas iniciativas para a redução do desperdício alimentar, para tornar as práticas agrícolas mais amigas do ambiente, para combater as dietas desequilibradas, para promover a escolha de produtos locais e para otimizar os processos industriais e de distribuição, nenhuma teve sucesso em integrar todas as dimensões num só estudo. O SOSFood apresenta-se assim como um projeto ambicioso, no qual a Nova Medical School da Universidade de Lisboa exerce um papel ativo na construção de uma imagem verdadeiramente global (holística e compreensiva) do sistema alimentar.




