Se não no Natal, quando…? 122

Por Rodrigo Abreu, Nutricionista na Rodrigo Abreu & Associados e Fundador do Atelier de Nutrição®

Chega Dezembro e, uma vez mais, começa a vivência dessa que é, para muitos, a época mais especial do ano! Da sua origem e simbolismo religioso, para uma festa de celebração da partilha e da família, o Natal é, também, incontornavelmente, sinónimo de uma gastronomia própria: o bolo-rei, as filhós, os coscorões, os sonhos, as azevias, as fatias douradas, o bacalhau, o peru ou o polvo. Todos, símbolos da reunião à mesa, da união entre aqueles que são próximos e se querem bem, lembretes do papel emocional e social da comida na vida do animal complexo que é o Homem. Ainda assim, com a evolução das taxas de obesidade e as crescentes preocupações com a “alimentação saudável”, o Natal tem vindo a tornar-se também sinónimo de calorias e de alguns quilos a mais. Como enfeites da árvore de Natal, surgem os avisos: “Atenção aos excessos!”, “Não abuse!”, “Cuidado com os doces e os fritos!”. Será o Natal assim tão perigoso? Fará sentido preocupar-nos com calorias nesta altura do ano? Será caso para dizer que se engorda entre a passagem de ano e o Natal (e não entre o Natal e a passagem de ano), ou, pelo contrário, é mesmo preciso limitar os excessos natalícios?

A evidência existente revela que durante o período festivo o aumento de peso é frequente. A maioria dos estudos* aponta para aumentos médios de 0,5 a 1 kg ao longo das semanas de dezembro e início de janeiro. Uma variação que, lida isoladamente, parece residual, mas que, na verdade, tem um detalhe interessante: estes gramas ganhos em Dezembro costumam teimar em manter-se durante o resto do ano. E esse é o ponto subtil: talvez o problema não seja o que se engorda no Natal, mas o que não se emagrece depois! Na verdade, é difícil ignorar a ironia: passamos o ano inteiro entre dietas adiadas, resoluções fugidias e promessas renovadas todas as segundas-feiras, e quando chega o Natal, um parêntesis emocional nas rotinas do quotidiano, atiramos para cima do prato (no duplo sentido) a responsabilidade de todos os desvios alimentares do ano. Como se o aumento de peso não fosse multifatorial, cumulativo, lento e silencioso.

Se o Natal é exceção, não a regra, não merecerá ser vivido como tal? A comida, nestes dias, carrega um simbolismo que transcende a Nutrição: é memória, é encontro, é convívio. Há um património afetivo nos pratos natalícios que não existe na salada do dia-a-dia. Receitas e sabores que nos definem culturalmente, e que nos deveriam ser permitidos saborear, sem remorsos ou pressão para contar calorias. Ser Nutricionista é, também, reconhecer o papel emocional e social da alimentação. E, nesta altura do ano, isso significa entender onde está o equilíbrio entre saúde e bem-estar, perceber a diferença entre uma alimentação nociva e algumas refeições menos equilibradas. Provavelmente, este é o maior desafio de ser Nutricionista: saber quando é o momento de “fazer dieta” e o momento de desfrutar, sem ignorar totalmente os princípios de uma alimentação saudável. Bolo rei, filhós, rabanadas… se não no Natal, quando?

 

* Publicações sobre aumento de peso nas Festas:

Yanovski JA, Yanovski SZ, Sovik KN, Nguyen TT, O’Neil PM, Sebring NG. (2000). “A prospective study of holiday weight gain.” New England Journal of Medicine, 342(12):861–867.

Helander EE, Wansink B, Chieh A. (2016). “Weight gain over the holidays in three countries.” NEJM, 375:1200–1202.

Schoeller DA. (2014). “The effect of holiday weight gain on body weight.” Physiology & Behavior, 134:66–69.

Stevenson JL, Krishnan S, Stoner MA, Goktas Z, Cooper JA. (2013). “Effects of holiday season on body weight and body composition.” Nutrition & Metabolism, 10:46.

Hull HR, Radley D, Dinger MK, Fields DA. (2006). “The effect of the holiday season on body weight and composition in college students.” Journal of Physical Activity & Health, 3(2):194–201.

Ma Y, Bertone ER, Stanek EJ et al. (2006). “Seasonal variation in food intake, physical activity, and body weight in a large cohort of adults.” Obesity Research, 14(11):2355–2364.