No digital, “perfis aleatórios surgem a promover produtos alimentares pouco saudáveis” 888

Quando têm de escolher entre um hambúrguer do estilo fast food ou um prato nutricionalmente mais equilibrado, em que os vegetais ocupam metade do prato, a maioria das crianças não pensa duas vezes e escolhe a primeira opção. Este fator associado, por exemplo, a dinâmicas familiares de alimentação pouco saudáveis, à inexistência de atividade física e a estilos de vida inadequados podem acabar por resultar num aumento de casos de obesidade infantil.

A oferta crescente de alimentos pouco saudáveis e processados a preços competitivos tem também uma forte influência nas escolhas alimentares das famílias. “O aspeto económico é muito importante, já que para algumas famílias não é fácil comprar peixe ou mesmo alguns vegetais. O preço do pão de forma embalado chega a ser menor que o pão do dia e uma refeição pré-confecionada é muitas vezes mais barata do que as opções mais saudáveis”, aponta Raquel Soares, médica pediatra no Hospital Pediátrico de Coimbra da ULS de Coimbra.

Por outro lado, as crianças e adolescentes são frequentemente expostos a publicidade de alimentos pouco saudáveis através de plataformas digitais, redes sociais e programas de televisão. Apesar da publicidade dirigida a menores de 16 anos estar proibida desde 2019, mais de metade dos anúncios publicitários na televisão e conteúdos online sobre alimentos (65%) são pouco saudáveis, segundo um estudo da DGS.

Obesidade infantil: Um problema de toda a família

Os mais novos, admite a nutricionista Inês Tomada, nutricionista do Centro da Criança e do Adolescente do Hospital CUF Porto, “são especialmente permeáveis a influenciadores digitais”. E embora possam encontrar nas redes sociais “páginas muito interessantes e educativas, com informação credível sobre nutrição e alimentação – nomeadamente perfis de profissionais de saúde -, no mesmo ecrã outros perfis aleatórios surgem a promover produtos alimentares pouco saudáveis, muitas vezes disfarçados de ‘opções rápidas e práticas’, ou mesmo publicidade a fast food, incentivos à prática de dietas extremas e a desafios alimentares prejudiciais, assim como à normalização do consumo de produtos alimentares ultraprocessados”, alerta.

Ecrãs e sedentarismo

A par das más escolhas alimentares surge a diminuição da atividade física. “Com o aumento do uso da tecnologia e do tempo gasto em atividades sedentárias, como televisão ou jogar videojogos”, lembra Mónica Pitta Grós Dias, nutricionista no Hospital de Santa Maria. “As crianças passam muito tempo sentadas à frente dos ecrãs sem se exercitarem”, trocando o ar livre, as bicicletas e o futebol pela televisão, os videojogos e o smartphone.

Ora, a falta de atividade física combinada com uma dieta inadequada pode aumentar o risco de desenvolverem excesso de peso ou mesmo obesidade, pelo que “é fundamental que pais e educadores incentivem a um equilíbrio saudável, promovendo hábitos alimentares adequados e a prática regular de exercício físico, reduzindo o contacto com o mundo cada vez mais digital”, defende a nutricionista.

Estratégias nutricionais no futebol virtual

Além disso, acrescenta a nutricionista Inês Tomada, a visualização de ecrãs perto da hora de dormir afeta o sono: “Sabemos hoje que um número de horas de sono insuficiente associa-se a desequilíbrios hormonais, com consequências no apetite, refletindo-se numa maior ingestão de alimentos densamente energéticos”.

Perante este cenário, é essencial tomar medidas preventivas para a obesidade durante a infância e adolescência, através da aquisição de hábitos alimentares saudáveis aliados à prática regular de atividade física e à redução do tempo em frente a ecrãs (televisão, computador, telemóvel). Neste sentido, garante Raquel Soares, “em cada consulta de vigilância de saúde, a promoção da alimentação saudável e atividade física deve estar presente nos planos do médico e enfermeiro, que estão responsáveis por dirigir estes ensinos aos cuidadores das crianças”.

“Obesidade infantil: um problema que vai (muito) além da balança” é o artigo de destaque da última edição da VIVER SAUDÁVEL, afeta aos meses de maio e junho, já disponível. Leia o artigo completo na Revista dos Nutricionistas.